terça-feira, 24 de setembro de 2013

PAF Shoot-Out: Comparação de 7 captadores atuais estilo "PAF"

Oscar Isaka Jr.

           Num dos posts falando sobre Les Paul e PAFs, o Dalton deixou um comentário sugerindo que fizéssemos um comparativo entre alguns modelos populares de captadores feitos atualmente e que prometem entregar a sonoridade "PAF" clássica. Com essas comparações, poderíamos ter uma referência e poder assim escolher um deles com mais confiança.
O Dalton me enviou gentilmente um pedaço a sua coleção de captadores para que junto a alguns dos meus pudéssemos traçar um comparativo e ouvir as diferenças. É claro que eu não pude recusar a oferta e depois de muita solda e troca de caps chegamos a um quadro comparativo muito bacana que vamos dividir em 3 posts para manter o foco.

Vai um PAF aí?

PAF "Double White"

Já o citamos aqui muitas vezes e você provavelmente já ouviu esse termo. Então, o que é um PAF?

A história do captador "PAF" é a própria história do humbucker.
Em 1955, Seth Lover, engenheiro da Gibson, criou o primeiro captador sem ruído, formado por duas bobinas (e não uma, como era até então) com polaridades magnética e elétrica invertidas (a inversão das fases provoca cancelamento do hum). Ele não apresentava o "Hum"(ruído interno de 60 Hz) inerente aos captadores de bobina simples.

A Gibson batizou-o de "Humbucker" e, para evitar cópias, no final de 1957 colocou um adesivo na base
escrito "Patent Applied For" (Patente Pendente). Abreviado, "P.A.F."



À partir de 1957, esses humbuckers passaram a equipar quase todas as guitarras da Gibson. Em 1959 a patente foi aceita e, à partir de meados de 1962, o adesivo mudou para o número da patente ("Patent Number"), que por sinal não era o número correto, numa tentativa de confundir a concorrência, talvez.



Por volta de 1964, a Gibson "modernizou" a fabricação dos captadores, com máquinas automáticas e fios
modernos. A partir daí, esses humbuckers passaram a ser conhecidos como "T-Tops" (por causa de uma marca "T" na bobina de plástico). Nesse momento, a fórmula mágica perdeu-se para sempre.



Por uma coincidência do destino, os captadores feitos entre 1956 e até meados de 1964 entraram para a
história por causa de sua sonoridade única. As máquinas, materiais e o processo de fabricação utilizados
entre 1956 e 1964 não foram perfeitamente documentados, por isso o PAF original nunca pode ser 100%
replicado...

Mas esse captador só ficou famoso mesmo nas últimas décadas, quando os guitarristas perceberam que ele era um dos principais responsáveis pelo timbre mágico das Les Paul do período. Foi aí que ele ganhou o apelido de "PAF".

A sonoridade PAF é um mito e todos sabemos disso. Seus segredos e originalidade são ainda um mistério e até hoje ninguém conseguiu reproduzir totalmente a sonoridade que carimbou o timbre do Rock nos anos 60 em gravações de ZZ Top, Eric Clapton , etc. e persiste até os dias de hoje.
A dinâmica, explosão ("bloom") o conteúdo harmônico, o ataque e complexidade do humbucker PAF original são ainda perseguidos por fabricantes de captadores do mundo todo pela dificuldade de se balancear as variáveis da equação.

Seth Lover determinou que um captador "Humbucker" (cancelador de ruído) tivesse duas bobinas, cada uma com 5 mil espiras (metade das 10 mil do P90) ligadas em série com fases elétricas opostas e campo magnético oposto. No entanto a imperfeição do processo dos anos 50 e o constante corte de custos praticados pela Gibson como empresa, randomizou as unidades dos captadores. A capacitância interna gerada pela bobina, as correntes parasitas das partes metálicas, o isolamento do fio, quantidade de material ferroso no imã de alnico, o tipo de alnico, seu grau de impurezas, tudo isso tem influência no som e é um verdadeiro desafio conseguir entender e/reproduzir.

Quem já testou e ouviu vários PAFs originais afirma que uns não soam tão bem assim e outros são mágicos. Provavelmente tem a ver com o tempo. Alguns não envelheceram bem.

PIF, PAF, BUM!
É isso mesmo. :) Hoje existem dezenas, centenas de fabricantes de captadores que alegam ter conseguido fazer uma cópia perfeita do PAF. Alguns inclusive adquiriram as máquinas originais da Gibson, outros conseguiram fio enamel da época que estava estocado em algum depósito antigo e a maioria alega que seu "PAF" é resultado de intensas pesquisas científicas de engenharia reversa.
Como a percepção é individual e tão randômica quanto o próprio PAF vários fabricantes produzem o que consideram a "sua" própria versão desse timbre histórico e por isso escolhemos alguns modelos "famosos" para essa comparação.
Espalhados no blog, há vários vídeos com sons de PAFs originais e uma breve pesquisa no YouTube pode lhe fornecer mais algumas dezenas de exemplos.
Não vamos perder tempo com "PAFs" modernos que são inferiores, alguns de marcas menores como GFS e também não vamos incluir os captadores Gibson (Burstbuckers, 57, etc.). Vamos direto para os "top":

Participantes do desafio:

  1. - Jim Rolph Vintage Pretender 58 Set (Sem capas)
  2. - Jim Rolph Vintage Pretender 59 Set (Com capas)
  3. - Lidy Fralin PURE PAF Set (Sem capas)
  4. - Lollar Imperial humbucker Low Wind Set (Com capas)
  5. - Seymour Duncan Custom Shop "Greenie Model" Set (Com capas)
  6. - Sérgio Rosar Mojo 13 Neck (Sem capa)
  7. - DiMarzio 36th Aniversary Bridge (Sem capa)
  8. - Bare Knuckle Stormy Monday Neck (Com capa)

A plataforma de testes foi a minha Gibson Les Paul R9. Cada captador foi instalado, teve sua altura regulada para o melhor som possível na guitarra e gravado nas mesmas condições. Separamos os caps de ponte e de braço para que possamos compara-los melhor. Os de braço gravados limpos para ouvirmos bem as nuances e detalhes do timbre enquanto que os de ponte achamos por bem gravá-los com saturação pois é onde eles realmente brilham.

Primeiro os de braço (a trilha inicial é do Clapton com os Bluesbrakers, o som da guitarra é de uma Les Paul 59 original com PAFs):



Conversei ontem com o Paulo e chegamos mais ou menos às mesmas conclusões, as quais vou compartilhar com vcs pois além de gravar eu toquei com eles no amp em diversas situações. Lembrando sempre que são as minhas impressões pessoais e intransferíveis de cada modelo. Todos soaram muito bem (acima da média) e se tratam de produtos especializados, mas quando comparamos uma Ferrari com um Corvette por exemplo, teremos opiniões para os dois lados! :-)




         Esse nós já conhecíamos de algum tempo e no teste provou sua fama. Muita dinâmica!! Cada nota tocada tem personalidade própria adquirida pela força e jeito da palhetada. Ataque preciso com o famoso "Bloom" e complexidade 3D nos médios. É o mais fraco e detalhado de todos os modelos mas se comporta muito bem com drives leves e moderados. O meu T Miranda Overdrive 35 S falou tão bonito com ele que quase não quis mais desligar o amp.

         Uma novidade que o Rodrigo encomendou e me deixou testar para fazer comparações. Tem praticamente todas as qualidades do modelo 58 com um pouco menos de dinâmica e um pouco mais de ganho. Fiz a colocação que é como se fosse um 58 com um pedal de compressor ligado o tempo todo, o que tira um pouco da complexidade de dinâmica, mas deixa o ataque mais rápido e enche mais os drives.

OBS: Pra saber mais sobre o Jim Rolph, leia esse post (clique)
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Lidy Fralin PURE PAF Set (Sem capas):



         Estava entusiasmado para ouvir os PURE PAFs devido a sua fama e prestígio no mundo dos PAFs. Sempre é citado pelos experts gringos e não é pra menos. Talvez os humbuckers mais "claros" e definidos que já tive a oportunidade de testar. Os médios no entanto soam meio "vazios" em comparação aos Rolphs, deixando menos evidente o bloom 3D mas o grande mérito de Lindy Fralin, foi conseguiu tuná-lo a ponto de soar preciso e definido, com uma excelente dinâmica e sem sobras de sibilância ou agudos. São o remédio exato pra uma Les Paul (ou qualquer outra guitarra) mais grave!

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Lollar Imperial humbucker Low Wind Set (Com capas) :
         Macios e precisos, os Imperials Low Wind tem um som pronto e pau pra toda obra com os médios mais cheios e meio "honky" e agudos mais comprimidos com uma personalidade bem própria. Aos meus ouvidos faltaram um pouco de dinâmica e os médios soaram um pouco entupidos e macios demais pra mim. O próprio Jason afirma que os Imperials não tem a pretensão de ser um clone de PAF, mas sim oferecer o que ele considera um BOM SOM DE HUMBUCKER.

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Seymour Duncan Custom Shop "Greenie Model" Set (Com capas):


         Estava muito curioso com esse set e confesso que adorei o resultado. Instalei o Greenie de braço ao contrário (com os parafusos virados para a ponte) conforme instruções e o resultado foi muito legal. Seu forte não é o som limpo (vou fazer um post dedicado a eles depois), mas mesmo assim gravei para compararmos com os outros e ele não ficou atrás, os médios são mais cheios e mais presentes, acredito até devido a posição invertida, mas o ataque preciso, complexidade sonora ë até um certo "bloom" estão presentes. Adorei esse set!
Os Greenies foram criados para replicar os famoso set de captadores da Les Paul de Peter Green/Gary Moore.
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         Os que acompanham o blog sabem da nossa saga para desenvolver o MOJO. Depois de inúmeros (13, para ser exato) testes e análises e tunnings de ouvido, o Sérgio chegou a esse modelo. A semelhança com o Rolph 59 chega a ser assustadora, portanto carrega todas as suas qualidades.

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          Tinha de novo grande expectativa nesse set devido a fama que a marca inglesa carrega. No entanto confesso que dentre os modelos aqui testados, o Stormy Monday foi o que menos me impressionou. Em comparação aos demais soou meio "flat", sem a profundidade e complexidade dos médios presente nos outros.
A dinâmica também se mostrou um pouco mais limitada, mas ele mantém muito do ataque e presença característicos dos PAF, coisa difícil de se encontrar em outros modelos que se vendem como PAFs por aí.

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          A capa influencia ligeiramente nas frequências agudas, pra ser bem básico na explanação. Um humbucker com capa de nickel possui mais correntes parasitas, que na prática limam um pouco dos agudos mais altos.  Humbuckers sem capa soam com um pouco mais de presença, com a impressão de serem mais "abertos". A diferença é marginal, mas vale a pena ser comentada. A capinha não deixa um humbucker pior ou melhor, apesar altera levemente a resposta como um todo, dependendo também da guitarra.

E vocês? Quais são os seus preferidos?

Grande abraço!



(Paulo May):
    Interessante como as nossas opiniões sobre humbuckers - PAFs em particular - têm coincidido. O Jr me enviou os áudios sem falar nada e depois observamos praticamente as mesmas impressões.

A primeira coisa que eu observo é a dinâmica - cada intensidade tem que ter uma nuance própria.
Todos são muito bons ou excelentes, mas vamos aos detalhes:

Eu achei o Greenie excelente, mas falta um pouco de complexidade nos médios. O Fralin neck é um pouco desequilibrado nos médios, mas foi o melhor na ponte (próximo post), com uma saturação leve. O Lollar é exatamente o que ele próprio fala: mais "smooth", macio. Tem um tipo de sonoridade que agrada uma parcela bem representativa de guitarristas, mas pra mim é um captador previsível e obediente demais - tá longe de um PAF. O Bare Knuckle, tão famoso nos fóruns e undergrounds da vida, foi uma decepção - linear demais. Os Rolph são nitidamente superiores, mais nervosos, mais complexos e agradavelmente imprevisíveis. O 58 tem um pouco mais de dinâmica.

A surpresa ficou por conta do Rosar Mojo 13, que, como bem disse o Jr., é praticamente 95% idêntico ao Rolph 59. É a prova de que santo de casa também faz milagres!! :)






sábado, 7 de setembro de 2013

Relic? Como relicar sua guitarra sem fazer m.....! (Telecaster de Freijó)

Paulo May    


(obs: antes de fazer perguntas e ou postar comentários, leia aqui: CLIQUE)


         Primeiro, desculpem o ar arrogante do título. Não sou expert em relicagem e nem acho que as minhas ficaram tão boas assim, mas que tem muita guitarra "relic" ridícula por aí, tem!

         A palavra inglesa "Relic", originalmente utilizada para objetos religiosos antigos mas hoje aplicada para antiguidades de valor em geral, acabou virando um neologismo (ou estrangeirismo, mais especificamente) aqui no Brasil, principalmente no mundo guitarrístico.
Não só a adotamos como substantivo, pareando com a nossa vernácula "Relíquia", como já a transformamos no verbo "Relicar" (neologismo lexical), assim como fizemos com o "Deletar". Relicagem, portanto, seria o ato de relicar. Em suma, envelhecer artificialmente alguma coisa. O trabalho artístico de relicagem existe há muito tempo, está geralmente ligado ao artesanato e possui técnicas específicas diversas, a maioria aplicável em guitarras.
Particularmente, considero esse estrangeirismo muito útil e é até difícil acreditar que a palavra "Relicagem" não existia na língua portuguesa.

Como já mencionei em um post anterior, essa moda de envelhecer guitarras, reza a lenda, iniciou-se dentro da Fender Custom Shop, acho que nos anos 90. Aparentemente eles fizeram uma Telecaster para presentear o Keith Richards e ele a devolveu dizendo mais ou menos isso: "Se vocês derem uma gastada nela, eu a tocarei". Daí a coisa não parou mais... :)

Dito isto, e antecipadamente pedindo desculpas aos proprietários das mesmas, apresento-lhes algumas "pérolas" negativas dessa arte:

Exemplos de relicagem ruim

         A Fender Custom Shop hoje tem uma divisão só pra relicagem. Embora a técnica tenha melhorado muito, a essência randômica do processo de envelhecimento natural de uma guitarra praticamente impede que o processo seja muito automatizado. Por isso, temos também algumas pérolas bem feinhas (e caras) saídas da Custom Shop. Nesses casos, não devemos confundir "exagero" com "heavy relic":


Tenho amigos guitarristas que acham ridículo comprar uma guitarra "falsamente envelhecida". Um lado meu também acha isso, mas não deixo de apreciar relics bem feitos.

Como já me perguntaram várias (muitas) vezes sobre os relics que faço em algumas guitarras, tava na hora de um post sobre isso. Depois de decidir fazê-lo, pesquisei um pouco na internet e descobri muitos sites com dicas fantásticas. Tô até arrependido de não ter feito isso antes, pois minhas relicagens foram todas puramente intuitivas. Mas deu pro gasto :)

Como ponto de partida temos que sempre considerar o processo de envelhecimento natural de uma guitarra - os anos e anos de pequenas batidas, arranhões, pó, gordura, suor, luz... Até o oxigênio ajuda a envelhecer as nossas preciosas. O envelhecimento é. portanto, um fenômeno lento, aleatório e cumulativo.
Não adianta pegar uma lixa e raspar algumas bordas da guitarra pra retirar a tinta. Esse relic "instantâneo" é horroroso e extremamente artificial:

Essa tele tá muito feia. Putz! Ela apresenta o principal erro de relicagem: utilização de apenas lixas e "lesões" com limites das regiões regulares e lisos. Isso definitivamente não acontece no processo natural. No detalhe:


Também ridículo é o que vi em um vídeo no Youtube: um cara fica jogando e arrastando a guitarra pelo chão durante uns 5-10 minutos e depois acha que ficou "ótimo". Bah!

Uma telecaster Custom Shop em especial, pode confundir, pois apresenta o famigerado "exagero" na região de encosto do braço direito: é a Esquire 54 do Jeff Beck. Aquilo foi proposital e feito por John Maus (Walker Brothers), de quem Beck comprou a guitarra, na tentativa de acrescentar os contornos de uma strato. Ele simplesmente não quis pintá-la após fazer os cortes e um desavisado pode achar que aquilo foi provocado pelo tempo/desgaste. Observem que John Maus fez o contorno de trás também.:


Bem, mãos à obra. Vou descrever como faço meus relics, da maneira mais fiel possível para evitar uma avalanche de perguntas:

Vocês já viram a Strato "Wally" de marupá (clique para o link):




E a Telecaster Butterscotch também de marupá (clique para o link):




         Pois bem, paralelamente aos relics, eu estava numa fase de testar (novamente, mas acabou de vez) madeiras brasileiras e encomendei com o Adriano Ramos, da RDC Guitars de Belo Horizonte, um corpo de telecaster de FREIJÓ. Tava louco pra saber como o freijó soaria no formato tele. Observem que, como faço os relics de forma meio intuitiva, nunca arrisquei num corpo de alder ou ash. Se desse algum problema de acabamento e o Freijó soasse maravilhoso (nem tanto), seria só encomendar um novo corpo com o Adriano...
Eis o corpo quando chegou. 3 peças, como sempre muito bem feito, só faltando o lixamento final:


Eu queria um relic semelhante ao da Tele branca do Vince Gill, mas a tinta branca em spray é terrível. Não sei por que, mas escorre bem mais que as outras. Então voltei pro velho rolinho, como havia feito com as duas anteriores. Se a ideia é relicar, pintar com rolo é até mais fácil.
Depois de algumas demãos de branco puro:


Passo 1: PINTURA



Como o rolinho (e qualquer coisa exceto spray) deixa as camadas muito ásperas e rugosas, Eu passei uma lixa 320/400 após 2 ou 3 demãos.
Em seguida, como já estava nos meus planos, fui acrescentando algumas gotas de corante amarelo (tava usando tinta à base de água, que não é  a adequada para madeiras, mas eu tinha tempo pra deixar tudo secar bem). A cada demão, colocava umas 5 a 10 gotas de corante. Nas últimas duas demãos, acrescentei 5 gotas de corante verde. Isso foi proposital porque é o que ocorre na natureza: a porção de qualquer tinta branca que está em contato com o meio ambiente sempre vai amarelar com o tempo - às vezes, um amarelo esverdeado. Quando eu fosse lixar/arranhar/riscar/esfregar, já teria naturalmente um "degradê" nos limites das bordas.
No final, tava assim:


Na relicagem, é  interessante não sermos muito "regulares" nas demãos, por incrível que pareça :)
Lixei novamente para deixar a superfície sem muitas rugosidades e já aproveitei aí para lixar algumas áreas mais do que outras. Onde eu pretendia fazer um relic mais pesado, lixei mais, porém ainda sem expor a madeira. Só queria chegar mais no branco inicial nessas áreas.

Material para o relic: lixas (200/400 para a parte pesada e no final, 600 e 1200), limas diversas (a tubular foi importante aqui), chave de fenda (ou qualquer metal com corte), corantes (ppte o amarelo e marrom), grafite em pó (para a "sujeira" - aqui pode ser até pó de verdade mesmo. Cinza de cigarro também é ótima) e óleo de peroba.



Comecei lixando e limando as áreas principais. Novamente, é essencial que não sejamos regulares, temos que evitar a todo custo a uniformidade. Em alguns pontos atue mais, em outros menos.Alterne entre as lixas e as limas e de vez em quando, faça algum risco mais agressivo com a chave de fenda. Não abuse da profundidade, exceto em alguns pontos focais e bem pequenos (que simulariam a guitarra batendo em algum objeto pontiagudo):
Então, regra número 1:
Evite isso aqui:

Coisa horrível. Tem coisa mais feia do que um "feio" padronizado e focado??



Início da relicagem:

Passo 2: MACHUCANDO A GUITARRA




Observe como existe uma textura rica e irregular, tanto na pintura quanto no padrão aleatório. O local escolhido para o foco da relicagem não é aleatório, óbvio - é sempre alguma região onde há mais atrito natural. Na parte traseira, nunca podemos nos esquecer do foco na região onde a guitarra bate no cinto e/ou botão da calça. No detalhe:


Depois de parar muitas vezes, olhar muitas vezes, de perto, de longe, de lado, parece que tá ok. Deu de machucar a guitarra.


Passo 3: SUJEIRA!

         Agora, precisamos simular a sujeira que vai acumulando com o tempo e está sempre acentuada nas partes "machucadas". Lembro também que, numa situação natural, as lesões na guitarra são feitas gradativamente, então, o grau de sujeira nunca pode ser igual pra todas as marcas. Algumas nem é bom sujar - teoricamente, são as mais recentes... :)


         Começo sujando com corante amarelo e um pentelho de marrom, novamente, aleatórios. Além de escurecer um pouco os machucados, os corantes acentuam o degradê das bordas/limites deles. Deixo secar por uns 30 minutos e depois retiro com panos secos, úmidos e bem úmidos. O seco, bem esfregado, com força, faz o corante penetrar mais. Se passar do ponto, retire com os panos molhados. Se passar demais, use lixa 400 ou 600 - sai tudo. Deixe o corante amarelo manchar um pouco a guitarra, relaxe. Se necessário, dá pra retirar as manchas excessivas mais tarde, antes de passar o verniz incolor final.


Nesse ponto, já começo a utilizar umas pitadinhas de grafite. Selecione algumas lesões para serem mais "antigas" - nessas, carregue mais o grafite.  Pingue uma gota de óleo se quiser que penetre mais na madeira - isso deixa o aspecto ainda mais envelhecido e eu utilizo ppte nas regiões principais - nessa guitarra, acima do nível do prendedor da correia e na região de encosto do braço. Esfregue com os dedos. Use o polegar para maior pressão, se necessário. Nas guitarras de marupá, que é uma madeira bem clara, utilizei mais grafite. No freijó, menos.
Daqui em diante, não dá pra explicar muito mais. É no gosto de cada um. Eu nunca faço tudo de uma vez. Gosto de ficar um dia sem ver e reavaliar depois com o "olho fresco". Coloco as peças por cima e fico olhando... :)



Passo 4: DETALHES FINAIS

Nessa guitarra, quase no final achei que avancei demais no ponto de apoio do braço e num outro perto dele. Como tinha a tinta em mãos, peguei um cotonete e repintei/escondi alguns pontos. São os pontos em detalhe (observe depois como estarão mais atenuados nas fotos finais):


Um close up da relicagem. Tem gente que pensa que dá pra fazer esse efeito só com lixa. Nem pensar.


No final, passo lixa 600 (bem leve), penduro novamente a guitarra e utilizo verniz em spray/lata pra "fixar" toda a bagunça e sujeira. 3 a 5 demãos. Espero dois dias pra secar bem, depois lixa 1200 (eventualmente um pouco da 600 antes, se necessário), cera automotiva Grand Prix para dar uma leve lustrada final e deu pra bola! :)

Acho que foi mais difícil decidir a cor do escudo do que relicar a guitarra! KKKK! Mas ficou o preto.

Seguem as fotos finais. Pode não ter ficado um relic "Custom Shop", mas tá BEM melhor e mais natural do que aquelas baixarias que mostrei antes.




Daí, quando fui colocar o braço, tive que resolver entre o com escala de maple e o de rosewood. Se fosse o de maple, teria que relicar o braço. Rick Parfitt ou Vince Gill? Ganhou o Vince Gill e dei uma envelhecida no braço também (nem pergunte, explico em outro post):



         Não quero mais fazer relicagem - tá perdendo a graça, mas acho que vou ter que fazer uma última vez - sempre quis uma tele branca velhinha e quase deu. Infelizmente, o  Freijó ficou um pouco abaixo das minhas expectativas. Não que tenha soado mal - só não soou do jeito que eu gosto. Ontem coloquei o braço de rosewood e o timbre melhorou bastante, mas ainda tá soando com muito punch de médios graves e falta um pentelhinho de brilho. Tenho certeza que se eu colocar uma ponte ferrosa (essa é uma Gotoh de latão), ela vai ficar melhor ainda - pro meu gosto, é claro. No ponto que tá já deve agradar muita gente. :) O Freijó é uma madeira mais "Hard Rock", sem dúvida. Boa, mas falta-lhe um pouquinho de sutileza.

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

No Mundo das Falcatruas: Braço Giannini de "Waffer"

Paulo May

Falcatrua: "Artifício que se usa para iludir pessoas ou fraudar alguma coisa."



         Já sabemos dos inúmeros truques que os fabricantes, não só chineses, utilizam para cortar custos de material. Surpreende-me entretanto a habilidade deles em esconder esses truques. As maquiagens são quase perfeitas e algumas talvez jamais conseguiremos descobrir. Bem, talvez exceto numa situação excepcional como a que presenciei na "Officina Luthieria", do Alex Arroyo e Inaldo aqui de Florianópolis:

       Fui pegar alguns braços cujos trastes o Inaldo havia trocado pra mim e ao chegar encontrei o Alex com uma braço de violão Giannini (desses novos, feitos na China, pois acho que da antiga e gloriosa Giannini tupiniquim só restou o nome) quebrado justamente no ponto da colagem espanhola, perto do headstock.
O Alex pegou a peça e disse: "Dá uma olhada nisso - a escala de rosewood é só uma folhinha e embaixo é tudo compensado..."
Juro por tudo que é sagrado que quando vi aquilo, na hora me lembrei de um "Waffer" - parecia um "Bis" mordido" KKKK! :)
Vergonha, vergonha ... Onde isso vai parar?


A base do braço até que tem uma parte de madeira "sabe-se lá qual" aparentemente sólida, mas da metade pra cima, é tudo laminado da pior espécie - "compensado" também se aplica.


 Esse blog nasceu para isso - temos como foco a obrigação de esclarecer. Eles tem que anunciar uma falcatrua dessas como "escala/braço de madeiras laminadas com folha de rosewood". De posse dessas informações, podemos ou não comprar o violão. Um mínimo de honestidade já basta.

A Giannini já foi uma empresa de produção 100% brasileira e de respeito. Sempre produziu seus próprios equipamentos aqui no Brasil. Nem todos bons, é verdade, mas temos que reconhecer que havia um esforço do pessoal. Certamente hoje em dia não dá mais pra competir com os produtos chineses e tenho quase certeza que a Giannini virou apenas uma importadora, como quase 90% das "fábricas" nacionais.

Estamos numa "terra de ninguém". Parece que o mais esperto vence e tem mais lucro vendendo gato por lebre. Enquanto o governo não estabelecer uma legislação/controle de qualidade nessas importações inescrupulosas, nós é que pagamos o pato...

Antes que perguntem, o braço em questão apresentava pintura preta, que encobria perfeitamente o "waffer". Caso tenhas um violão suspeito,  desses made in China, talvez dê pra checar essa falcatrua retirando o nut/pestana.

ADENDO 09/09/13:
Realmente, temos que considerar que são geralmente violões que custam menos que 300 reais. Como diria o ditado "Você recebe o que você paga".
Mas a questão acho que nem é essa. Em essência, reclamo da "omissão/disfarce (plywood)" desse detalhe nas especificações do violão. O comprador tem que saber que o braço é de compensado.