terça-feira, 22 de julho de 2014

Fender American Vintage 60th Anniversary 1954 Stratocaster

Oscar Isaka Jr

1954 e Leo Fender estava lançando talvez a guitarra que seria o modelo mais influente e usado de todos os tempos, a Stratocaster!

Pois bem, em 2014 a Stratocaster fez seu aniversário de 60 anos e claro que a Fender não poderia deixar passar essa data em branco e lançou uma série de guitarras comemorativas a data. Lançadas oficialmente na NAMM, temos modelos como a  Squier Classic Vibe mais acessível até modelos super caros como os Custom Shop Heavy Relic e todas com alguma característica única, seja na captação, ou pinturas limitadas etc. Todas tem algo bacana que me fariam tranquilamente querer uma de cada (Mr Obvious,.. rsrs)  mas uma me chamou muito a atenção, a American Vintage 1954. A proposta era seguir a risca as especificações do modelo lançado em 1954, como corpo de ASH, braço de maple, pintura em Nitrocelulose na cor "sunburst two-tone" e novos captadores 1954 desenvolvidos especialmente para o modelo. Eu lendo isso tudo e com viagem a trabalho para os EUA marcada. Nem preciso dizer que a GAS subiu-me pelas paredes e fiquei acompanhando as notícias. Precisava pelo menos testar uma dessas American Vintage 1954.


Já nos EUA depois de um dia pesado de reuniões de trabalho, estava na Guitar Center matando tempo tocando guitarras quando vi pendurada na parede a Squier Classic Vibe de aniversário. A guitarra era linda e tinha uma pegada e sonoridade realmente incríveis (especialmente com o preço de US$ 300,00), quando o vendedor  perguntou se eu precisava de alguma ajuda enquanto eu brincava com ela. Comentei como as guitarras comemorativas estavam excelentes e etc quando ele comentou que tinha alguns outros modelos e que iria me trazer. Achei que ele ia trazer o modelo mexicano e o Am Std mas a primeira foi a Am Vintage 54. Maldição, justamente a que eu queria testar e pela foto acima nem preciso dizer o que aconteceu. rsrs

Antes de falar da sonoridade, queria mostrar alguns detalhes particulares da 1954. Vou falar de novo a Fender REALMENTE acertou nesse modelo. O corpo feito de Hard Ash é mais pesado e tem veios mais próximos que o Swamp Ash. O braço é um Soft V de Plain Sawn Maple mais gordo que o normal muito próximo de um braço de LesPaul, mas ainda com pegada Fender. O escudo e o 1 ply branco de 8 parafusos, e a elétrica foi reproduzida nos mínimos detalhes, com pots CTS e até o capacitor "Paper in WAX" de .1 MFD reproduzido pela Fender.


Os captadores, segundo a própria Fender, foram redesenhados especialmente para esse modelo comemorativo, e diferentemente do já existente Custom Shop 54 (modelo preferido do Paulo), esses tem magneto de Alnico 3 e bobinamento mais leve medindo 5.7k no braço, 5.8k no meio e 5.9k na ponte. Não sei se esse equilíbrio foi proposital, mas foi o que medi nos meus.


Há também uma marcação SR referente a "Special Run" na cavidade do catador do braço e notem o detalhe nos saddles estampados com a inscrição "Fender Pat.Pend." até então só encontrados nos Saddles vintage originais ou em modelos Custom Shop específicos.

Nessas fotos é possível notar os veios do ASH do corpo, que recebeu uma pintura super fina de nitrocelulose. Tão fina que é possível sentir os veios do ASH em relevo na pintura.

  



Knobs, Tip e capas de baklelite
Os knobs da 54 (chamados de "Mini-skirt" ou mini-saia) também são levemente diferentes dos Top-Hat modernos, assim como o tip do seletor de captadores. Esses mesmo modelos de Knobs e seletor estão presentes na Am Vintage 1954 de maneira muito fiel a original (a direita). Notem que os knobs tem a parte dos números menor que o tradicional moderno e o tip da chave seletora tem um formato mais ovalado (conhecida como Football) ao invés do triangular mais pontudo moderno.



As capinhas dos captadores também são levemente diferentes, tendo as bordas mais arredondadas que as modernas com cantos mais vivos, detalhes esses novamente respeitados na Am Vint 54.


Todas essas peças era feitas na época de um plástico chamado de BakeLite que quebrava muito facilmente e que foi posteriormente alterado para um plástico menos quebradiço, que é usado até hoje. Não tenho certeza se os da Am Vint são BakeLite mas acredito que não.

1954 Reissue - Knobs, Tips e Capinhas "Vintage Correct"
                             
Ok, tudo muito bonito e Vintage Correct, mas e o som Oscar? Isso foi o que me fisgou nessa guitarra, o timbre dessa Am Vint 54 é algo meio diferente do que eu estava acostumado ultimamente. Sempre gostei e procurei o timbre anos 60, macio nos agudos e graves com médios redondinhos com aquela sonoridade Scooped tantos eternizaram, desde SRV até Jimmy Hendrix mas a 54 é o exato oposto disso tudo. Independente dos aspectos históricos e estéticos que adicionam ao total da guitarra, assim que pluguei no Bogner Lafayete ainda na Guitar Center e toquei a primeira nota o som veio como um soco no estômago. Nunca havia ouvido um ataque de médios tão seco e direto numa Strato e ao mesmo tempo rico e complexo. Agudos e graves estão presentes mas os médios percussivos e cheios com alta amplitude dinâmica e equilibrio me fizeram na hora pensar "então esse é o RICH TONE OF ASH que todos falam". Até então nenhuma Strato de ASH tinha me encantado, e pela primeira vez um timbre clássico de Strato que não o famoso "Bell-Like Tone" dos anos 60 havia me fisgado. Eu só havia ouvido esse DNA de Strato 50s de ASH + Maple em vídeos do Phill X nas Strato 54 vintage originais, mas nunca ao vivo.





Conclusão: Minha busca pelo timbre de Strato 50s terminou aqui.... :-)

Eu normalmente não sou 100% fã dos vídeos da Nstuff, mas nesse ele demonstra bem os timbres dela.. Esse som com drive... POOTZ!! 





PS: Além da American Vintage 54, a Fender também lancou outros modelos comemorativos (Clique aqui) e todos os que eu testei na loja, desde a Squier até a American Std são ótimas guitarras. A Fender tem acertado em cheio nos ultimos tempos com séries cada vez melhores e vemos menos da inconsistência que assombrou a marca nas últimas duas décadas. Vale a pena checar os modelos todos!! Segue um pequeno vídeo demonstrativo da linha.


quinta-feira, 17 de julho de 2014

sexta-feira, 11 de julho de 2014

Vintage X Moderno (ou: a minha história com a Roland)

Paulo May

        Quando eu falei para o Oscar que estava pensando em postar sobre esse assunto, ele já chicoteou: "Cara.. Isso é polêmico e vai gerar uma enxurrada de perguntas e posicionamentos..."
Mas, diante da minha última experiência com a Roland (a primeira foi em 1986), fui obrigado a publicar o post, mesmo correndo o risco :)
         Eu não sou e nunca fui um daqueles guitarristas do tipo "solista técnico/virtuoso". Sempre gostei mais de bases e arranjos, da procura do groove perfeito entre guitarra base, bateria e baixo - e eventualmente piano. Durante a época (1983-1994) que tive banda e estúdio de gravação, onde compunha jingles e trilhas, sempre busquei maneiras de ampliar os limites dos sons de guitarra. Não foi à toa, portanto, que adquiri uma guitarra "midi", uma Roland GR 707 em 1986 (ou 87). A guitarra tinha um visual futurista e uma estranha barra de carbono numa segunda junção braço/corpo para minimizar as vibrações do braço e estabilizar a captação dos sinais pelo captador hexafônico. Ela era preta, mas igual a essa (de um anúncio dos anos 80):


O "tracking" das notas era complicado, tínhamos que tocar de forma bem diferente de uma guitarra normal, evitando bends, ruídos e slides desnecessários. Aquela barra realmente incomodava e pra completar, era um porre pra tocá-la sentado. Ela ficou largada até por volta de 2000, quando resolvi serrar a barra de estabilização e usá-la como guitarra normal (feita pela Ibanez, com corpo de alder). Quando perguntavam que guitarras eu tinha, ficava até engraçado: "duas teles vintage, uma 1968 e outra 1974 e uma Roland GR707!!" KKK!
Em 2004, joguei tudo dessa guitarra fora e só fiquei com a ponte (interessante - nunca vi outra igual) e o braço, que pode ser visto aqui em 2011, já desfigurado, numa telecaster:

Ainda tenho o braço solto por aqui:).
Bem, o fato é que "NÃO FUNCIONOU" pra mim e desde então, vinha mantendo distância de guitarras desse tipo. Nos últimos 10 anos entretanto, com o contínuo aumento da capacidade de processamento das CPUs, as empresas desenvolveram - e evoluíram - o conceito de "modelagem acústica". Vejam bem, isso não tem nada a ver com MIDI, sampler, sintetizadores, etc. "Modelagem Acústica" é a simulação digital da física que gera sons ao nosso redor. Alguém já disse que o universo pode ser traduzido em números e acho que estamos no alvorecer de uma revolução: a "Virtualização da Realidade". Cada nova geração de hardwares e/ou softwares simuladores ou modeladores está vindo melhor, mais real, orgânica e cada vez mais difícil de distinguir do equipamento original. Já postei sobre o Amplitube e a última versão está matadora...
Não se enganem comigo: quem acompanha o blog sabe que eu (e o Oscar também, garanto) sou fanático por timbres vintage, guitarras clássicas, válvulas, etc. Mas não sou um xiita radical: minha mente respeita, antes de tudo, meus ouvidos. Não interessa o que está gerando um som - se gosto dele, eu quero.

Mas vamos voltar à minha história com a Roland... :)
Eu conhecia o sistema "COSM" de virtualização da Roland (desde que foi lançado, há bem mais de uma década), sabia da guitarra "Synth Ready" GC-5 mas nem pensar em sequer testá-la já que o preço aqui no Brasil é absurdo.
Sem eu me dar conta, entretanto, a Roland lançou uma versão mais barata, a GC-1, que, ao invés de ter todo o sistema (captador GK3 + Processador) embutido (o que comprometia a GC-5 enquanto guitarra real, pela grande quantidade de madeira do corpo que era retirada), a GC-1 é uma stratocaster autêntica, apenas com um recesso da parte de cima para o GK3 e uma pequena cavidade extra na traseira - na verdade, uma extensão da cavidade do jack de saída.

Essa opinião que tenho em relação à GC-5 é compartilhada pelo meu amigo (e grande guitarrista/violonista) Zeca Petry, que passou algumas dicas essenciais para o meu update técnico em relação a esse sistema da Roland. 

Há uns 15 dias, entrei numa loja aqui de Floripa e vi essa guitarra Fender/Roland GC-1 à venda por 1.900 reais:




Nem pensei nela como "Synth Ready" - à princípio analisei objetivamente e o que vi foi uma ótima strato, com um excelente braço de maple "one piece" (braço e escala de uma peça), corpo de alder com 3 partes (a camada de PU é por sorte fina e dava pra ver os limites das colagens). Levei sem nem ao menos tocá-la. Mesmo que a utilizasse somente como uma strato normal, já valia. Em casa, fui checar as especificações e descobri que o braço e boa parte das ferragens (tarraxas incluídas) são feitos no EUA. O corpo de alder, captadores e ponte, são mexicanos.

Depois de tocá-la por cinco segundos, já tinha 95% de certeza que os captadores eram cerâmicos - e aí vai minha primeira pergunta pra Roland: Por que colocar captadores tão inapropriados (e ruins para uma strato) numa guitarra tão boa e bem acabada? Não faz sentido.
Por que manter aquele infame bloco de zinco das standards mexicanas? 3 captadores de alnico e um bloco de aço elevariam essa guitarra a um nível superior e os custos não seriam tão diferentes.
Acredito que esses dois detalhes perderam-se na logística entre a Fender e a Roland - faltou um pouco mais de visão, pois essa guitarra poderia facilmente ser anunciada também como um excelente instrumento clássico.

O braço é realmente muito, muito bom. Pode até não ser americano e/ou tive sorte nessa guitarra, mas os trastes estavam perfeitos, 100% alinhados (raro em qualquer guitarra) e super macios nas pontas, com "zero" de rebarba. Como provavelmente será a guitarra que usarei em eventuais performances ao vivo, garanti uma estabilidade extra trocando as tarraxas Fender comuns por Fender com trava, que eu já tinha por aqui.

ADENDO 16/8/14: O leitor Yyz me apontou a página da Roland onde há uma explicação para o qualidade que percebi nessa guitarra: " It’s mostly made from American Standard Strat parts: the alder body, 22-fret neck, frets, and tuning keys are the same ones found on every US Standard. The pickups and bridge are of the vintage type found on old Strats, and now used in Mexican standard Strats, so it’s a hybrid."... Então é isso mesmo: apenas os captadores e a ponte são da (ruim) strato Standard mexicana e o resto é da American Standard. A guitarra é montada no México - daí a confusão. Isso explica porque ela me chamou a atenção na loja - o corpo e braço são obviamente superiores.

Obviamente, tomei o cuidado de gravar uns licks com os cerâmicos e em seguida coloquei um set de captadores de alnico 5 e fio formvar, além de um bloco Manara e saddles de aço, meus preferidos.
A diferença da sonoridade entre os caps cerâmicos e alnico é brutal. Só quem não gosta ou não conhece o timbre de uma strato iria aprovar aquele lixo cerâmico. Ouça:


 Ouça a diferença entre os captadores cerâmicos e os de alnico.



Acima, uma foto com a prova do crime. Caps com duas barras cerâmicas/ferrite na base.



 O corpo foi bem feito - cavidades H-S-S, cobertas com tinta condutiva.

ATENÇÃO: muito cuidado ao movimentar o escudo - a fiação do GK3 limita o posicionamento do escudo para troca dos captadores. É necessário, com muito cuidado, abrir a tampa traseira do circuito, estender os fios que estão presos sob pressão às paredes da cavidade e só depois posicionar o escudo para trabalhar.

Bem, com os novos captadores, bloco Manara e saddles de aço, agora ela passou a soar como uma stratocaster de verdade, e das boas. Resolvi então - e só após isso: garantir que ficaria uma boa strato "per se", ouvir demos dela junto com o (essencial) módulo sintetizador GR-55. Entre as várias demos que encontrei, uma em especial me convenceu a comprar o GR-55: o inglês "James", funcionário da Roland, demonstrando a GC-1 e o GR-55 para uma loja na internet:


O James é muito legal - típico guitarrista "normal" fazendo uma demo "normal" e objetiva. As demos da própria Roland carregam o estigma de "guitarra para nerds" que infelizmente vemos desde os anos 80 - e mesmo o Steve Stevens não ajuda em nada. Essa demo, por exemplo (clique) é muito brega e na minha opinião espanta qualquer guitarrista curioso que vá até o site da Roland checar o GR-55. Mas esqueçam essas bobagens. Depois de sacar o sistema com o James, o resto é complementar:



Aqui a demo da empresa para o GR-55. O estilo "TV Globo" do locutor é inadequado e kitsch, pra variar:


         Então, se vocês acompanharam até agora, do meu ponto de vista, continuo sem muito interesse em utilizar a guitarra pra gerar sons de piano, sopros, sintetizadores, etc. O legal mesmo desse sistema são as modelações e afinações. De brinde, um multi efeitos de alta qualidade e o sintetizador.

Não a utilizaria muito em casa - os timbres que ela modela eu já tenho em outras guitarras e todos de alta qualidade. A mão na roda, a puta mão na roda disso tudo, é a extrema versatilidade para ensaios e shows ao vivo. Não há o que pague sair de uma strato em afinação padrão para uma tele em open G e depois passar para um violão Martin D28 (o GR-55 modela o corpo/ressonância de vários violões Gibson e esse Martin), tudo com apenas dois cliques... :)

Com os vídeos do youtube e o manual, em menos de dois dias já dominei relativamente bem o sistema e criei meus próprios patches. Já posso tocar Gimme All Your Lovin' (Les Paul com humbucker/Marshall/afinação padrão), Honk Tonk Women (Telecaster/Twin/Open G) e Shake Your Money Maker (Les Paul com P90/Twin Reverb/Open E com slide) com apenas uma guitarra e não três!

Dessa vez eu e a Roland nos entendemos :)

PS: Se alguém da Roland está lendo isso, novamente chamo a atenção para os detalhes dos captadores e bloco da ponte e, por favor, vocês vendem a guitarra sem o cabo de 13 pinos GK e o GR-55 também sem o cabo. Putz! No sense. As lojas nem sempre têm esse cabo disponível e temos que adquiri-lo separadamente - um banho de água fria justamente quando não precisamos.